A violência doméstica: uma reflexão multidisciplinar para além do crime (VDCrim)

A violência doméstica continua a ser um problema social especialmente grave, em Portugal e não só. Trata-se de fenómeno complexo, que em virtude das suas nefastas consequências para as vítimas e seus familiares, quer em razão das suas multifacetadas causas, que só muito dificilmente são apreendidas, mesmo com a análise criminológica mais acurada.

Nota-se uma sensação ou mesmo convicção generalizada de que as instâncias formais de controlo da criminalidade e de combate à violência doméstica falham sistematicamente na sua missão e que a intervenção sancionatória do Direito Penal chega tarde demais. Está difundida uma certa ideia de cansaço ou esgotamento da atuação do sistema jurídico nesta matéria.

Ao assumir uma pretensão holística, presente projeto de investigação pretende explorar vertentes legais, psicossociais e pedagógicas que se encontram mais ou menos latentes na fenomenologia da violência doméstica e no modo como a sociedade contemporânea decidiu tratar esta realidade. Nesta premissa, a análise do Direito em vigor será um incontornável ponto de partida e a análise da norma incriminadora contida no artigo 152.o do Código Penal será um necessário ponto de passagem de uma jornada que não se confina ao universo muitas vezes formal da mera aplicação da lei e do exercício do poder punitivo do Estado. Por se tratar de assunto vasto e rico em possibilidades heurísticas e explicativas, a violência doméstica lança um convite para o desenvolvimento de um conjunto de ações e atividades multidisciplinares aberta para a pluralidade perspetivas e experiências que contribuirão, efetivamente, para a construção de narrativas mais eficazes sobre o modo com a comunidade de mulheres e homens historicamente situados enfrenta as causas e as consequências do fenómeno.

O grande objetivo é alinhar a diversidade dos debates científicos e teóricos com um olhar direcionado para uma lógica de prevenção que seja suficientemente permeável à integração séria e definitiva de uma nova componente na complicada equação do problema da violência doméstica: o papel da educação na formação de uma cultura de cidadania e de respeito pelos direitos humanos fundamentais. Para este fim, os saberes da psicologia, das ciências sociais e das ciências educativas, bem como o seu cruzamento com o saber jurídico-penal, serão cruciais para uma sinergia capaz de contribuir para politicas públicas mais ajustadas. A Lei n.o 112/2009, de 16 de setembro, sinaliza a importância de estimular iniciativas que colaborem para o desenvolvimento mais eficaz de medidas de prevenção da violência doméstica e de proteção das vítimas. É neste horizonte, intencionalmente recortada, que a investigação proposta se insere, com a preocupação de fazer o esforço científico frutificar, em nome do princípio da igualdade, na efetiva prestação de serviços à comunidade e na promoção do desenvolvimento autónomo e socialmente responsável da pessoa humana.

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